Uma análise crítica de cunho acadêmico
Por Gui
Barreto
Palavras cansadas dentro de uma carta de despedida. Seria
realmente isso o Testamento Vital? Esse é o documento que, segundo o Conselho
Federal de Medicina (CFM) dá direito ao paciente que enfrenta uma doença
terminal de escolher como e quando irá encerrar sua existência. No entanto, há
inúmeras contradições quanto a tal prática, uma vez que, a medicina não aprova
a Eutanásia, assim como a igreja católica a condena, mas, há quem diga que cada
ser humano possui o direito de escolha suas ações.
Diante da ideia de livre-arbítrio, nos vemos enjaulados,
pois as igrejas condenam essa ação, mas, se tais instituições também pregam a
palavra de Deus, como compreender esse paradoxo? Porque na bíblia diz que: ‘’Eis
que o homem se tem tornado como um de nós, conhecendo o bem e o mal. Ora, não
suceda que estenda a sua mão, e tome também: Gênises 3:22’’ Partimos
então do seguinte pressuposto, se o Livro mais antigo do mundo nos revela que o
homem tem por natureza a consciência do bem e do mal, como dizer que a
Eutanásia é algo maléfico uma vez que todos temos o direito de escolher o que
achamos ser o nosso melhor?
Na cama fria, com cheiro de remédio e inúmeros aparelhos,
ninguém, a não ser o paciente e suas dores, consegue traduzir o quão
angustiante é enfrentar essa ou aquela enfermidade, e se é no próprio corpo que
se faz obrigatória à tolerância dos tratamentos, como acreditar que alguém
possa definir com mais certeza se um doente deve ou não continuar a viver? Bem
como, deve-se respeitar a intenção de cada um, porque o intimismo é um canto
escuro na alma de cada ser vivo, onde lá habitam as frustrações, as vontades,
os sonhos, mas em alguns momentos, a necessidade de desistir se torna o único
morador a fazer estadia.
Porque interferirmos nas palavras de alguém cujo
corpo não suportar mais? Basta essa pergunta para entendermos as fragilidades
da vida humana, porque ninguém sabe o quanto precisa ser forte, até que a força
se torne a última alternativa, para tanto, é necessário a sutil compreensão de
que, se não somos capazes de percorrer as estradas um dos outros, se não nos
vemos capacitados para arrancar a dor dos outros, e melhor, se estamos
realmente longes de sermos um cristo, devemos então aceitar a ida daqueles que
passam noites gritando de dor, tendo tolerância a medicamentos que causam
efeitos colaterais quase que diabólicos, sem falar no estado vegetativo em que
o corpo se prostra.
A eutanásia é um cenário que assombra as mais diversas
opiniões, porque não estamos sozinhos no mundo, logo, isso nos faz perceber que
existem leis que nos regem, entre elas, o não direito a violação dos direitos
humanos, que em seu patamar mais elevado, pode ser caracterizado como o direito
de viver e escolher, no entanto, há também o livre-arbítrio, que segundo a
igreja católica, é o pode de Deus dado aos fieis para tomar decisões, sempre
acreditando que os mesmos, irão optar pelos caminhos da divindade; já a
Filosofia, em toda sua grandeza, acredita que o Livre-arbítrio tem origem no
determinismo, que defende que todos os acontecimentos da vida, sejam eles
cotidianos ou não, são causados por fatos anteriores, isto é, o ser humano pode
fazer aquilo que bem entender com sua vida.
O despertador toca, o corpo geme, as inflamações se
tornam punhais, essa é rotina de quem acorda com dores e vive com elas. Quem
suporta tanto? O testamento vital pode ser o melhor caminho para a chamada
humanização, porque embora a medicina e o Brasil sejam contra tal pratica, e
quando acontecem fatos semelhantes até a classificam como homicídio, ainda sim,
não podemos esquecer que fazer uma carta onde se esclarece como e quando quer
morrer, sem duvidas não é o mesmo que fazer uma poesia ou compor uma musica,
certamente é algo que dói na alma daqueles que escrevem, no entanto, quando a
carne dói mais, o corpo começa a ter o desejo de tocar as nuvens, cuja crença
se volta plenamente à ideia de que a paz estará em qualquer lugar, menos no
leito de um hospital.
Embora o assunto seja delicado, conviver com pessoas que
enfrentam doenças terminais, me parece ainda mais pesado aos olhos, porque
nunca se sabe como serão os próximos dias, e pior, para aqueles cujos lençóis,
remédios, e dores se tornaram companhia, nunca se sabe quando tudo isso
terminará, então, nesse desejo de que o doente fique, porque não suportaremos
sua perda, faz com que o ego familiar inflame a ponto de se tornar cego, sem
perceber que a maior perda já esta acontecendo, porque tal paciente não vive,
vegeta.
O ser humano tem um instinto egoísta, dá-se isso por uma
simples visão de mundo, em que as oportunidades são escassas e a globalização
monstruosa, ou seja, cada um quer devorar o outro, entretanto, diante de tal realidade,
será que até na hora de morrer temos que seguir regras? Só quem está no leito,
sabe como é, por isso, respeitar pode de ser um caminho de paz, sentimento
esse, tão distante desse mesmo leito.
Liberdade: Há quem diga que esse é o verdadeiro conceito
de livre-arbítrio, mas seu significado abrange aspectos religiosos,
psicológicos, morais e científicos, porém, talvez a mais correta tradução dessa
palavra, seja o adjetivo empatia, que nos traz a reflexão do quão é importante
nos colocarmos no lugar do outro, mesmo que para isso tenhamos que entender o
que é a letra e o espírito.
Desejar a morte quando não se tem mais expectativas, pode
ser uma forma de agradecer pela vida, que assim como tudo na existência, um dia
chega ao fim, porque não somos robôs, por isso, enfrentamos ciclos, que
certamente, não é um atestado vital que defini o fim de nosso respirar, e sim a
força que já não se tem, nem para lutar, nem para viver. E ás vezes, desistir,
pode ser uma maneia de ter coragem, sim, muita audácia para perceber que a vida
pode ser um romance, mas que em algum momento, terminará, tal como escreveu
Luis Gasparetto: ‘’Tudo tem começo e meio. O fim só existe para quem
não percebe o recomeço’’.
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